sexta-feira, 2 de dezembro de 2005

Vaipim, Cochim

Apontamentos que me serviram para a produção da minha primeira peça radiofónica, como correspondente da Rádio Renascença na Índia. Foi a 18 de Novembro e foi surpreendentemente difícil. Nunca imaginei que fosse tão complicado falar para a rádio. "Leia mas não dê a entender que está a ler" disse-me a editora... Amanhã (Festa de S. Francisco Xavier em Goa) volto a tentar...

«D. José Policarpo chegou hoje à cidade de Cochim, no sul da Índia, que esteve sob domínio português entre 1500 e 1663. A ocasião é histórica, comemorando-se o fim do processo de renovação e de restauro da Igreja de Nossa Senhora da Esperança e o quarto centenário da sua consagração, em 1505.

A cerimónia contará também com a presença do Embaixador João de Deus Ramos, em nome da Fundação Oriente que financiou a recuperação da igreja, com dois técnicos de restauro especialmente vindos de Portugal. O Bispo da Diocese de Cochim, John Tattumkal e ministros do governo estadual do Kerala representam o lado indiano. D. José celebrará a missa da parte da tarde e irá depois descerrar uma placa comemorativa, marcando a data.

A igreja está localizada numa pequena península a norte de Cochim, a chamada ilha de Vaipim, separando-a da cidade uma pequena baía, onde no século XVI ancoraram os navios de Pedro Álvares de Cabral, Vasco da Gama e Afonso de Albuquerque.

Cochim, rebaptizada de Ernakulam pelas autoridades, é hoje uma típica cidade indiana, com quase três milhões de habitantes. No seu seio subsiste o centro histórico, com forte influência colonial, portuguesa, holandesa e inglesa. Mas os dois séculos de domínio português deixaram o património mais importante. Para além das belas igrejas, de uma ou outra rua ou estabelecimento comercial com nome português, ou das muralhas portuguesas do seu forte, são os quase 200 000 católicos da Diocese de Cochim a mais forte herança deixada.

As cerca de 50 famílias lusodescendentes na ilha de Vaipim, nas redondezas da Igreja de Nossa Senhora da Esperança, são o testemunho mais vivo da presença histórica portuguesa. Falam num crioulo indo-português que já foi muito estudado por académicos de todo o mundo, mas está mais do que nunca em perigo de extinção.

Originalmente uma comunidade piscatória, os habitantes do bairro de Vaipim têm grande devoção a Nossa Senhora da Esperança, cuja estátua é ladeada no altar da igreja pelas figuras de S. Domingos, S. José, S. Francisco de Assis e Sto. Agostinho. Em estilo maneirista, o altar é do século XVI e estava inicialmente em Cochim. Com a conquista holandesa do forte e a expulsão dos portugueses, os crentes transferiram-no para a ilha de Vaipim, onde foi colocado na Igreja da Esperança, resistindo aos novos tempos protestantes, primeiro com holandeses, depois com ingleses.

Entre os habitantes de Vaipim predominam nomes portugueses como Luís, Joaquim, Domingos ou Rosário e em dias de festa entoam-se orações e cânticos marianos num português antigo mas quase perfeito. É na gastronomia que mais se faz sentir ainda a língua portuguesa, lembrando os mais velhos ao correspondente da Rádio Renascença, ainda em Março deste ano, as várias formas de preparar cozinhados. Temperado, cozido, secado, assado, enumeram, para depois saltarem logo para as sobremesas como o "figo doce" ou o "bôl coco".

E não deixam de apelar a mais apoios de Portugal para que possam manter este património vivo, sendo que os mais novos já pouco sabem do crioulo e desconhecem o passado português. A vinda de D. José é assim um grande motivo de festa para a Diocese local, mas em especial para a comunidade de Vaipim.»

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